Free eBook, AI Voice, AudioBook: O crime do padre Amaro, scenas da vida devota by Eça de Queirós

AudioBook: O crime do padre Amaro, scenas da vida devota by Eça de Queirós
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O CRIME DO PADRE AMARO
CENAS DA VIDA DEVOTA
TERCEIRA EDIÇÃO
Inteiramente refundida, recomposta, e differente na fórma e na acção da edição primitiva
PORTO
LIVRARIA INTERNACIONAL DE ERNESTO CHARDRON
Casa editora
LUGAN & GEMELIOUX, Successores
1889
Todos os direitos reservados
Porto: Typ. de A. J. da Silva Teixeira, Cancella Velha, 70
NOTA
(DA 2.^a EDIÇÃO)
O Crime do Padre Amaro recebeu no Brazil e em Portugal alguma attenção da Critica, quando foi publicado ulteriormente um romance intitulado--O Primo Bazilio. E no Brazil e em Portugal escreveu-se (sem todavia se adduzir nenhuma prova effectiva) que O Crime do Padre Amaro era uma imitação do romance do snr. E. Zola--La Faute de l'Abbé Mouret; ou que este livro do auctor do Assomoir e de outros magistraes estudos sociaes suggerira a idéa, os personagens, a intenção do Crime do Padre Amaro.
Eu tenho algumas razões para crêr que isto não é correcto. O Crime do Padre Amaro foi escripto em 1871, lido a alguns amigos em 1872, e publicado em 1874. O livro do snr. Zola, La Faute de l'Abbé Mouret (que é o quinto volume da série Rougon Macquart), foi escripto e publicado em 1875.
Mas (ainda que isto pareça sobrenatural) eu considero esta razão apenas como subalterna e insufficiente. Eu podia, emfim, ter penetrado no cerebro, no pensamento do snr. Zola, e ter avistado, entre as fórmas ainda indecisas das suas creações futuras, a figura do abbade Mouret,--exactamente como o veneravel Anchises no valle dos Elyseos podia vêr, entre as sombras das raças vindouras fluctuando na nevoa luminosa do Lethes, aquelle que um dia devia ser Marcellus. Taes coisas são possiveis. Nem o homem prudente as deve considerar mais extraordinarias que o carro de fogo que arrebatou Elias aos céos--e outros prodigios provados.
O que, segundo penso, mostra melhor que a accusação carece de exactidão, é a simples comparação dos dois romances. La Faute de l'Abbé Mouret é, no seu episodio central, o quadro allegorico da iniciação do primeiro homem e da primeira mulher no amor. O abbade Mouret (Sergio), tendo sido atacado d'uma febre cerebral, trazida principalmente pela sua exaltação mystica no culto da Virgem, na solidão d'um valle abrazado da Provença (primeira parte do livro), é levado para convalescer ao Paradou, antigo parque do seculo XVII a que o abandono refez uma virgindade selvagem, e que é a representação allegorica do Paraiso. Ahi, tendo perdido na febre a consciencia de si mesmo a ponto de se esquecer do seu sacerdocio e da existencia da aldeia, e a consciencia do universo a ponto de ter medo do sol e das arvores do Paradou como de monstros estranhos--erra, durante mezes, pelas profundidades do bosque inculto, com Albina que é o genio, a Eva d'esse logar de legenda; Albina e Sergio, semi-nús como no Paraiso, procuram sem cessar, por um instincto que os impelle, uma arvore mysteriosa, da rama da qual cae a influencia aphrodisiaca da materia procreadora; sob este symbolo da Arvore da Sciencia se possuem, depois de dias angustiosos em que tentam descobrir, na sua innocencia paradisiaca, o meio physico de realisar o amor; depois, n'uma mutua vergonha subita, notando a sua nudez, cobrem-se de folhagens; e d'ahi os expulsa, os arranca o padre Archangins, que é a personificação theocratica do antigo Archanjo. Na ultima parte do livro o abbade Mouret recupera a consciencia de si mesmo, subtrae-se á influencia dissolvente da adoração da Virgem, obtem por um esforço da oração e um privilegio da graça a extincção da sua virilidade, e torna-se um asceta sem nada d'humano, uma sombra cahida aos pés da cruz; e, é sem que lhe mude a côr ao rosto que asperge e responsa o esquife de Albina, que se asphyxiou no Paradou sob um montão de flôres de perfumes fortes.
Os criticos intelligentes que accusaram O Crime do Padre Amaro de ser apenas uma imitação da Faute de l'Abbé Mouret não tinham infelizmente lido o romance maravilhoso do snr. Zola que foi talvez a origem de toda a sua gloria. A semelhança casual dos dois titulos induziu-os em erro.
Com conhecimento dos dois livros, só uma obtusidade cornea ou má fé cynica poderia assemelhar esta bella allegoria idyllica, a que está misturado o pathetico drama d'uma alma mystica, ao Crime do Padre Amaro que, como podem vêr n'este novo trabalho, é apenas, no fundo, uma intriga de clerigos e de beatas tramada e murmurada á sombra d'uma velha Sé de provincia portugueza.
Aproveito este momento para agradecer á Critica do Brazil e de Portugal a attenção que ella tem dado aos meus trabalhos.
Bristol, 1 de janeiro de 1880.
Eça do Queiroz.
O CRIME DO PADRE AMARO
I
Foi no domingo de Paschoa que se soube em Leiria que o parocho da Sé, José Migueis, tinha morrido de madrugada com uma apoplexia. O parocho era um homem sanguineo e nutrido, que passava entre o clero diocesano pelo comilão dos comilões. Contavam-se historias singulares da sua voracidade. O Carlos da Botica--que o detestava--costumava dizer, sempre que o via sahir depois da sésta, com a face afogueada de sangue, muito enfartado:
--Lá vai a giboia esmoer. Um dia estourra!
Com effeito estourou, depois d'uma ceia de peixe--á hora em que defronte, na casa do dr. Godinho que fazia annos, se polkava com alarido. Ninguem o lamentou, e foi pouca gente ao seu enterro. Em geral não era estimado. Era um aldeão; tinha os modos e os pulsos d'um cavador, a voz rouca, cabellos nos ouvidos, palavras muito rudes.
Nunca fôra querido das devotas: arrota
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